quinta-feira, 5 de julho de 2012

A bola não entra por acaso


O ano era 2007. Um pequeno grupo de apaixonados pelo Corinthians desembarcava em Barcelona, na Espanha. Tinham uma reunião importante com Ferran Soriano, então vice-presidente do Barcelona, o clube que havia sido campeão da Liga dos Campeões na temporada anterior. Daquele encontro saiu uma parceria de trabalho. Soriano passou a ser uma espécie de consultor desse grupo. Contou como o Barcelona fez para deixar de ser um clube que sempre “batia na trave” para se tornar “Mais que um clube”.

Quando a diretoria liderada por Soriano assumiu o Barça, em 2003, o primeiro passo dado foi equacionar as dívidas para conseguir fazer com que o clube passasse a ter fluxo de caixa. Depois disso, foi investir no resgate da imagem da instituição e o reforço de suas origens (surgindo daí o investimento no slogan “Mais que um clube”). E, por fim, o Barcelona montou um time para ganhar dentro de campo. Em todo esse caminho, segundo Soriano, havia um mantra dentro do clube. Nenhuma decisão seria tomada após uma derrota.
O lema no clube era: “decisões, só na segunda-feira”.
Em 10 de outubro de 2007, esse grupo de apaixonados passou a compor a nova diretoria do Corinthians, eleita após a renúncia de Alberto Dualib, desgastado pelo fim da terceira parceria econômica do clube que começava como sonho e terminava como pesadelo.
Como primeira medida, essa diretoria mudou o estatuto corintiano, limitando a permanência do presidente no cargo. Depois, equacionou todas as dívidas que haviam. O terceiro passo foi planejar 2008, começar a analisar o time, quais jogadores poderiam ser aproveitados e, mais do que isso, torcer. Afinal, naquela ocasião, o Corinthians destroçado pelo fim do acordo com o MSI lutava para não ser rebaixado no Campeonato Brasileiro.
De todos os passos iniciais, o único que deu errado foi dentro de campo. O planejamento do time, em dezembro de 2007, passava a ser voltar para a elite do futebol nacional. Um baque e tanto para aquele bando de loucos pelo Corinthians, mas que encontraram no caos o ponto de virada para resgatar a paixão do corintiano pelo seu time.
“Eu nunca vou te abandonar” passou a ser o mote da campanha para que o Corinthians não parasse. As vendas da camisa que reforçava o amor de um clube rebaixado à Série B do Brasileirão foram estrondosas. E mostrou que “a força da Fiel” era até maior do que os próprios loucos daquele bando imaginavam.
Loucura, aliás, que não pode ser confundida com audácia.
Audácia em assumir a condição de Série B na comunicação com o torcedor; audácia em contratar um treinador para disputar a Segundona e firmar um contrato de três anos com ele, garantindo que não seria qualquer percalço que o faria ser demitido; audácia em acreditar que o Corinthians tinha de aumentar a receita peitando o mercado e acreditando na força da marca, quebrando um contrato com a Samsung e achando um com quase 50% de aumento com a Medial Saúde, mesmo com o time na Série B.
O mantra, enquanto isso, seguia o mesmo. Não tomar a decisão de cabeça quente, para não colocar um trabalho feito fora de campo a perder por conta do resultado dentro dele.
No mundo dos negócios, uma empresa prospera quando tem foco e persistência. Não é diferente do mundo do futebol, embora muita gente ainda acredite que as coisas são “diferentes” quando o tema é a indústria do esporte.
A noite de 4 de julho de 2012 marca não apenas a independência da República Popular do Corinthians, mas reforça a tese de que o bom desempenho dentro de campo depende, e muito, daquilo que é feito fora dele. Não, a conquista alvinegra não apaga muitos dos erros cometidos pela antiga e atual diretoria do Corinthians. Mas, sem dúvida, a vitória histórica do Timão tem tudo a ver com a mudança de mentalidade que foi implementada lá em outubro de 2007.
Como diz Ferran Soriano, um dos mentores intelectuais desse Corinthians, a bola não entra por acaso. E, com certeza, a conquista da América não foi por acaso. Sorte do futebol.

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