O Esporte Executivo trouxe na última 3ª feira a decisão do Grupo Pão de Açúcar de vender o Audax, clube que atualmente possui equipes na primeira divisão dos campeonatos estaduais do Rio de Janeiro e de São Paulo.
Após o anúncio do Pão de Açúcar, o Grupo Casino, que é controlador do primeiro, também falou, assim como o próprio Abílio Diniz, que demonstrou toda sua insatisfação via Twitter. Faltava a visão do Audax. O Esporte Executivo conversou na tarde desta 5ª feira com o gerente executivo do clube, Thiago Scuro, que falou abertamente sobre o momento vivido pelo Audax. Na conversa, o gestor que foi indicado no último ano com um dos melhores executivos de futebol do país e assim já é reconhecido, também falou sobre a estrutura montada pelo Audax que levou o clube à elite do futebol em SP e RJ, sobre a profissionalização do esporte no Brasil e até sobre uma sondagem recebida recentemente do Vasco.
Esporte Executivo: Thiago, pra começarmos a conversa, o anúncio feito pelo Grupo Pão de Açúcar muda a vida do Audax?
Thiago Scuro: Seguiremos com o trabalho que é desenvolvido no Audax. Temos definido o planejamento para um clube que não pode parar. Precisamos dar andamento e continuar até que tenhamos uma definição.
Esporte Executivo: Quais são suas expectativas para o futuro do clube?
TS: Quando vier um novo controlador ou grupo, seja quem for, certamente encontrará um clube organizado, com um bom grupo de profissionais, uma equipe competitiva e orçamento equilibrado. Só então veremos o que será decidido. Repito que agora nada para. Continuamos nosso trabalho visando o 2º semestre e as primeiras divisões estaduais no RJ e SP em 2014.
Esporte Executivo: O Pão de Açúcar mencionou, ao justificar a decisão da venda do Audax, que a chegada do clube à elite dos estaduais de RJ e SP exigiria mais recursos do Grupo. Você concorda?
TS: O planejamento do Audax prevê sim um aumento no investimento necessário para times na elite dos campeonatos estaduais de RJ e SP. Mas entendemos que o valor não é maior que o retorno financeiro, que a receita gerada em função de o clube disputar essas divisões. Aumenta a necessidade de investimento, claro, mas também aumenta a receita.
Esporte Executivo: Você consegue dimensionar esse aumento?
TS: Vamos falar do campeonato de São Paulo, para exemplificar. A série A2 do Campeonato Paulista já tem uma alta competitividade. Se o clube não tiver uma boa equipe, não sobe. Prefiro não falar de valores, mas a folha salarial do Audax que chegou à primeira divisão em São Paulo, mesmo incluindo a comissão técnica, provavelmente não estava entre as folhas mais caras dessa divisão. A gestão precisa ser equilibrada.
Esporte Executivo: O Pão de Açúcar também citou que “o ciclo de evolução do projeto está concluído”…
TS: Me desculpe, mas não posso falar pelo grupo gestor, a quem respeito. Falo apenas pelo Audax. Para nós, o planejamento ainda é de crescimento. Há espaço para sermos o segundo clube de paulistas e cariocas. E mesmo no cenário nacional, com um trabalho realista, é possível chegarmos até a Série B do Brasileiro. Temos estrutura de trabalho para isso, que é atrativa para os jogadores. Tem jogador que é sondado para disputar a 2ª divisão nacional e prefere jogar conosco, mesmo que ainda estejamos em competições prioritariamente estaduais. Ser um bom empregador no futebol te diferencia. É importante tratar os profissionais do mundo do futebol com respeito.
Esporte Executivo: O Audax começou há 9 anos, focado na categoria de base. A evolução até o profissional já era prevista?
TS: O Audax continua sendo um clube focado em formação de atletas. É um clube formador, não investidor. O futebol profissional nasceu em 2007 como forma de dar continuidade ao trabalho. O projeto visava, como ainda visa, a inclusão social. Sem o profissional, formaríamos muitos atletas sem minimamente incluí-los no mercado. E então o projeto deixaria ser de inclusão. No Audax/RJ, por exemplo, 55% do elenco é formado por jovens de nossa base.
Esporte Executivo: E quem chega ao clube sem ter sido revelado na base?
TS: Quem vem precisa ter o perfil de atleta e cidadão que trabalhamos dentro do clube. Não temos, por exemplo, jogadores com problemas de noitada. E não digo apenas em relação aos que ainda estão conosco. Mesmo os que foram formados conosco e estão em grandes clubes, também não são jogadores que apresentam esse tipo de problema.
Esporte Executivo: Quando chega um jogador mais veterano, que já viveu muita coisa no futebol, qual a reação ao encontrar um clube como o Audax?
TS: Geralmente são jogadores com carreiras bem sucedidas, que tem mais visão do que é importante para o desenvolvimento de um atleta. Então eles admiram a estrutura que encontram, porque não é comum tê-la nos clubes brasileiros.
Esporte Executivo: Essa estrutura que você menciona conta com quantas pessoas trabalhando?
TS: Respondo para o presidente do clube, Fernando Solleiro. Temos cerca de 120 colaboradores considerando RJ e SP. Tenho três áreas ligadas diretamente a mim: Futebol de base, Futebol profissional e Apoio integrado, que contempla a área médica, fisiologia, psicologia, administrativo, alimentação, manutenção, entre outras.
Esporte Executivo: E qual o orçamento atual do Audax, considerando a existência de equipes no RJ e SP?
TS: Cerca de 22 milhões de reais ao ano.
Esporte Executivo: Com base nesses valores, você acha que é possível desenvolver um trabalho semelhante ao de vocês em outra região do Brasil, que não a Sudeste? Pensando no cenário de uma equipe apenas.
TS: Um projeto como o nosso funcionaria muito bem também fora do Sudeste. Talvez, pensando esportivamente, seria até menos complexo, porque a competição em outras regiões é menor. O custo também poderia ser até menor, mas a exposição de alcance nacional acompanharia essa redução. Para ter uma visibilidade em competições estaduais como em São Paulo ou no Rio de Janeiro, o investimento é maior. Mas a exposição acaba sendo quase nacional.
Esporte Executivo: Você pensa que o futebol brasileiro começa a efetivamente perceber a importância de profissionais na gestão dos clubes? Ou isso ainda é exceção?
TS: A criação da ABEX (Associação Brasileira dos Executivos de Futebol) é um exemplo do início desse processo de profissionalização do futebol. Os executivos têm falado mais entre si, o que é fundamental. Clubes com profissionais em seu quadro de gestão têm alcançado resultados importantes. Isso faz com que administradores amadores repensem suas ações, embora ainda resistam com medo de não serem mais importantes no cotidiano dos clubes.
Esporte Executivo: O futebol brasileiro hoje tem mais origens de receita e, consequentemente, mais dinheiro. Você pensa que estamos no caminho para termos um dos maiores, mais atraentes e mais competitivos campeonatos do mundo?
TS: O futebol brasileiro já é um dos mais competitivos do mundo, mas dificilmente se tornará dos mais atrativos em um curto prazo, em função da organização do futebol nos centros mais evoluídos. Na Europa, por exemplo, as janelas de contração são mais bem definidas e os clubes precisam errar o mínimo possível ao trazer um atleta. Há uma cultura estabelecida de profissionalização do futebol. A Europa passou por uma crise financeira e o nosso futebol não aproveitou como poderia. Ainda dá tempo, mas vai ficando mais difícil. Certamente poderíamos estar mais avançados.
Esporte Executivo: Falando em organização, é verdade que o Vasco quis te levar para organizar uma nova gestão no clube?
TS: O Vasco conversou comigo no meio desse primeiro semestre. Mas não chegou a ter uma proposta. Eu estava no meio de uma competição importante com o Audax, Brunoro tinha acabado de ir para o Palmeiras, eu não me sentiria bem em sair.
Esporte Executivo: Mas não acha que o momento dessa ascensão profissional está chegando?
TS: Profissionalmente me sinto preparado para um novo estágio de trabalho, em um grande clube. Mas por enquanto, sigo bem no Audax. No momento certo, acontecerá. E eu estarei pronto.